O Supremo Tribunal Federal reconheceu por unanimidade, na sexta-feira (28/05), a repercussão geral do Recurso Extraordinário nº 1.301.250, referente à viabilidade de quebra de sigilo em históricos de pesquisa na web. A Ministra Relatora Rosa Weber destacou, no voto condutor, a presença eminente de debate constitucional, em especial no que tange à necessidade de compatibilizar a proteção de dados pessoais com hipóteses de rompimento de sigilo.
Origem do Recurso Extraordinário: Caso Marielle Franco
O Recurso Extraordinário nº 1.301.250 se origina no inquérito policial do homicídio da vereadora Marielle Franco, ocorrido em 2018. A 4ª Vara Criminal da Comarca da Capital/RJ determinou que as companhias Google Brasil Internet Ltda e Google LLC disponibilizassem o endereço IP de todos os usuários que houvessem realizado buscas no Google concernentes ao endereço e à agenda de compromissos da Vereadora dentro do intervalo de cinco das anteriores ao seu falecimento.
As companhias, alegando desproporcionalidade e falta de fundamento da quebra de sigilo, entraram com Mandado de Segurança perante o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, e, diante da recusa do Mandado, prosseguiram com Recurso Ordinário ao STJ e, por fim, Recurso Extraordinário perante o STF.
O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve, de início, a determinação de quebra de sigilo da Vara Criminal, alegando a possibilidade de relativização dos direitos à privacidade e ao sigilo, especialmente diante de crimes graves e de grande impacto social.
O STJ, em mesmo sentido, negou provimento ao Recurso Ordinário apresentado pelas Empresas Google. O Superior Tribunal dispôs o critério de interesse público relevante, o qual, estando presente, justificaria o afastamento da proteção ao sigilo. Além disso, as ferramentas de Busca Google estariam reguladas pelo Marco Civil da Internet, que, em seus artigos 22 e 23 estabelece somente o critério de requerimento judicial devidamente fundamentado para que haja quebra de sigilo – critério observado no caso concreto.
O STJ endereçou, igualmente, a previsão do art. 2º da Lei n. 9.296/96, que proíbe a intercepção de comunicações telefônicas quando não houver indícios de participação do indivíduo na infração penal – limitação que, estendida aos históricos gerais de pesquisa online, impediria a quebra de sigilo, por não haver particularização de participação de cada eventual usuário no crime. O Tribunal elucidou que a interpretação extensiva da Lei 9.296/96 era inviável, visto que históricos-web, diferente de intercepções telefônicas, são registros informáticos de dados já coletados.
Críticas à Quebra de Sigilo
As empresas envolvidas, por sua vez, criticam que a potencial quebra de sigilo possa inflar exponencialmente o número de inquéritos policiais com solicitações de rompimento de sigilo. Apontam também os riscos relacionados a práticas de perfilamento de pessoas e segmentações discriminatórias a partir dos dados acessados.
A generalidade dos termos pesquisados e o intervalo relativamente longo de cinco dias foram pontos apresentados como danosos, uma vez que, segundo os recorrentes, provocariam lesão de direitos de pessoas inocentes, não relacionadas à investigação. Seriam ausentes, assim, os mínimos indícios práticos necessários para justificar uma ação vista como invasiva.
Repercussão Geral do Caso
No âmbito do Supremo Tribunal Federal, o Recurso Extraordinário interposto pelas empresas teve o reconhecimento da repercussão geral no dia 28/05. Com isso, a decisão do STF sobre a legalidade ou não da quebra de sigilo em pesquisas na internet vinculará os demais órgãos do Poder Judiciário, aumentando as expectativas sobre o posicionamento final do Tribunal e suas consequências sobre a proteção à privacidade no Brasil.
Ao STF competirá, portanto, consolidar a interpretação construída nas instâncias anteriores – favoráveis à quebra – ou, ainda, acolher os argumentos apresentados pela Google Brasil Internet Ltda e pela Google LLC no sentido de limitar as hipóteses de quebra de sigilo. O reconhecimento da repercussão geral, de todo modo, reforça a importância da decisão e o destaque do setor de proteção de dados no ordenamento brasileiro.
留言