Em mercados cada vez mais competitivos, a consolidação de uma marca e a implementação de técnicas inovadoras são verdadeiros diferenciais para alcançar o sucesso do negócio. Em diversos casos, modelos de negócios bem-sucedidos encontram oportunidades de expandir o seu alcance, mediante a abertura de novos estabelecimentos e a entrada de novos parceiros comerciais no empreendimento.
Nesse contexto, surge o Contrato de Franquia Empresarial, por meio do qual o franqueador cede ao franqueado um conjunto de recursos que compõem o chamado know-how empresarial da franquia, além dos direitos de uso da marca franqueada.
Por meio desse contrato, o franqueador vislumbra o potencial de expandir seu negócio de modo rápido, eficiente e seguro, multiplicando o número de estabelecimentos da rede e dividindo a administração do negócio com os novos parceiros. Ao mesmo tempo, preserva os elementos essenciais à marca e ao empreendimento.
Do outro lado, o franqueado visualiza a oportunidade de adentrar em um negócio que já possui uma marca consolidada e cujo modelo de negócios se provou bem-sucedido no Mercado.
Apesar de, à primeira vista, parecerem nítidos os benefícios aproveitados por ambas as partes dessa relação, é preciso ter atenção especial às principais obrigações pactuadas no Contrato de Franquia, dentro dos limites impostos pela nova Lei de Franquia Empresarial (Lei n.° 13.966 de 2019), que está em vigor desde março de 2020.
Neste breve artigo, daremos continuidade ao tema dos contratos de franquia empresarial, já abordado por nós em outra ocasião: link. Recomendamos, portanto, a leitura do artigo anterior, em que tratamos dos principais aspectos dessa modalidade de negócio e as principais características da Circular de Oferta de Franquia, documento obrigatório que antecede a assinatura do contrato de franquia.
Nesta oportunidade, trataremos (i) das novas regras referentes à sublocação do ponto comercial do franqueador ao franqueado; e (ii) da possibilidade de se criar associação ou conselho de franqueados para representação da “classe” perante o franqueador.
Nova regra de preservação do ponto comercial
Certamente, uma das questões centrais para o sucesso do negócio franqueado é a escolha de um ponto comercial que atenda às necessidades daquele produto, serviço ou marca, objeto do contrato de franquia. Igualmente, a partir do momento em que o ponto escolhido se prova adequado ao que propõe o modelo de negócios da franquia, a sua manutenção passa a ser do interesse de ambos, ou seja, do franqueado e franqueador.
A escolha do ponto comercial pode ser feita conjuntamente, entre franqueador e franqueado, durante as negociações do contrato de franquia, ou, ainda, pode se tratar de questão pré-estabelecida pelo franqueador. Nessa última hipótese, é costumeiro o franqueador locar, de terceiros, o imóvel que será utilizado como ponto comercial do negócio e, posteriormente, sublocá-lo ao franqueado.
Nesse sentido, a nova Lei de Franquias promoveu duas importantes alterações ao que dispõe a Lei de Locações (ou Lei do Inquilinato, Lei nº 8.245/1991), no que concerne à preservação do ponto comercial e à relação de sublocação entre franqueador e franqueado.
A primeira trata da legitimidade para propositura de Ação Renovatória de Contrato de Locação, sendo essa a medida judicial pela qual o locatário poderá pleitear a renovação compulsória de contrato de aluguel de ponto comercial, desde que preenchidos os requisitos dispostos na Lei de Locações, quais sejam: (i) que o contrato de locação tenha sido celebrado por escrito e por tempo determinado; (ii) que o contrato a ser renovado tenha sido firmado pelo prazo mínimo de cinco anos ou que a soma dos prazos dos diversos contratos de locação firmados entre as partes para aquele imóvel seja equivalente a cinco anos ou mais; e (iii) que o locatário esteja explorando seu comércio, no mesmo ramo, pelo prazo mínimo de três anos.
Nos termos do art. 3º da nova Lei de Franquias, tanto o franqueador sublocador quanto o franqueado sublocatário poderão propor Ação Renovatória contra o locador do imóvel. Trata-se de inovação com relação ao que dispõe a Lei de Locações, que, em seu art. 51, §1º, estipula: “no caso de sublocação total do imóvel, o direito a renovação somente poderá ser exercido pelo sublocatário”.
Nota-se, portanto, que a Lei de Franquias buscou privilegiar a preservação do ponto comercial não apenas em relação ao franqueado — que efetivamente explora a atividade no imóvel alugado —, mas também no que concerne ao franqueador, pois esse último poderá propor Ação Renovatória para manter o ponto comercial ainda que o franqueado manifeste o interesse de se retirar da rede de franquias.
Além disso, ainda nos casos de sublocação entre franqueador e franqueado, a nova Lei de Franquias, em seu art. 3º, parágrafo único, prevê que o franqueador sublocador poderá cobrar, do franqueado sublocatário, aluguel em valor superior àquele pago pelo franqueador ao locador. Novamente, trata-se de disposição que inova com relação ao que dispõe a Lei de Locações, que, em seu art. 21, é bem clara ao dizer que “o aluguel da sublocação não poderá exceder o da locação”.
Nessa questão, nota-se que a nova Lei de Franquias buscou conferir certa proteção ao franqueador, que poderá recuperar com mais eficácia e rapidez os custos que teve com a procura e a locação do imóvel destinado às atividades do franqueado.
Importante ressaltar, porém, que essa possibilidade deverá constar, de forma expressa e clara, na Circular de Oferta de Franquia e, também, no Contrato de Franquia, nos termos da própria Lei. Além disso, o valor pago a maior ao franqueador não poderá resultar em onerosidade excessiva ao franqueado, sob pena de resolução contratual (art. 3º, parágrafo único, incisos I e II, Lei de Franquias).
Associação ou conselho de franqueados e suas atribuições
É facultado aos franqueados a criação de uma associação ou conselho consultivo, no qual poderão discutir e alinhar seus interesses e, eventualmente, reivindicar certas demandas perante o franqueador. Trata-se de prática existente desde antes da vigência da nova Lei de Franquias.
A nova de Lei, por sua vez, apenas passou a prever, de forma expressa, que a COF deverá indicar a “existência de conselho ou associação de franqueados, com as atribuições, os poderes e os mecanismos de representação perante o franqueador, e detalhamento das competências para gestão e fiscalização da aplicação dos recursos de fundos existentes”.
Cumpre destacar que, nos termos do que dispõe a Lei, não basta a mera indicação de existência de conselho ou associação de franqueados, sendo necessário destacar as principais atribuições e competências daquele “órgão”. Além disso, a Lei menciona expressamente a “gestão e fiscalização da aplicação dos recursos de fundos existentes”. Isso, porque é comum, nos contratos de franquia, a cobrança de uma contribuição mensal sobre o faturamento dos franqueados, com destino a um fundo, cujos recursos serão revertidos em benefício de toda a rede de franquias. Ressalta-se que, muitas vezes, os valores captados para esse fundo são revertidos em ações institucionais em favor da marca, isto é, a realização de ações publicitárias em geral. Ocorre que a destinação dos recursos desses fundos geralmente é tópico de discussão entre os franqueados e entre os franqueados e franqueador.
Nesse contexto, uma das práticas que vêm sendo adotadas pelo mercado é a delegação da administração desse fundo, ou de parte desse fundo, à associação de franqueados. Assim, realiza-se uma espécie de gestão conjunta dos recursos do fundo, o que pode minimizar eventuais atritos resultantes das discordâncias naturais que os franqueados terão entre si quando o assunto for a destinação dos referidos recursos.
Além disso, cumpre frisar que a associação ou conselho de franqueados não deve ser entendido como “órgão” de oposição ao franqueador. Na verdade, idealmente, propõe-se que o franqueador aproveite essa oportunidade e estabeleça, através da associação de franqueados, efetivo canal de comunicação dentro da rede de franquias. É necessário, portanto, que ambos os polos interessados — franqueador e franqueado — alinhem seus interesses em prol do sucesso da rede de franquias. Como regra, o sucesso do franqueado é aproveitado pelo sucesso do franqueador e vice-versa.
Conclusão
Tendo em perspectiva que a nova Lei de Franquias passou a viger apenas em março de 2020, é de extrema importância que franqueados e franqueadores não apenas se inteirem das novas disposições trazidas pela Lei, como também acompanhem como as diversas novidades trazidas serão recepcionadas pelo mercado e pelos tribunais.
Agradecemos a leitura deste artigo e, desde já, reiteramos o convite de que acompanhe, em nosso site e em nossas redes sociais, a parte final desta série de artigos, em que trataremos das restrições impostas aos franqueados após o término do contrato de franquia; dos contratos internacionais de franquia; e das consequências da inclusão de cláusula compromissória de arbitragem no contrato de franquia.
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