No momento em que são publicadas as listas de aprovados no Vestibular, surgem questionamentos acerca da possibilidade de ingresso no Ensino Superior para os casos em que estudante ainda não concluiu o Ensino Médio.
No caso da Universidade de Brasília (UnB), por exemplo, a publicação da lista de aprovados em primeira chamada do Vestibular de 2022 será divulgada na próxima sexta-feira (18). Em razão da pandemia de Covid-19, que alterou o calendário de atividades da UnB, haverá um intervalo maior do que o usual entre a publicação do resultado e o término do período de matrícula (registro acadêmico on-line). No entanto, mesmo assim, é preciso que aqueles que pretendem ingressar na universidade sem terem concluído o Ensino Médio se atentem para as medidas cabíveis, as quais deverão ser tomadas da forma mais antecipada possível.
A fim de esclarecer as indagações que, naturalmente, surgem diante dessas circunstâncias, elucidamos aqui as principais dúvidas que envolvem o tema.
É possível ingressar na universidade sem ter concluído integralmente o 3º ano do Ensino Médio em minha escola?
Sim. A Declaração de Conclusão do Ensino Médio é um documento imprescindível para a realização do registro acadêmico on-line. Assim, a conclusão do Ensino Médio deverá ser realizada antes da realização da matrícula. Por outro lado, isso pode ser feito por meio de outra instituição, usualmente chamada de “supletivo”.
Todavia, dois cenários distintos se apresentam:
a. Candidatos com 18 anos ou mais anos de idade ao tempo da realização da matrícula no supletivo: neste caso, o certificado de conclusão pode ser obtido a partir do supletivo. Para tanto, basta matricular-se em uma instituição que se encaixe nessa categoria e realizar a prova de aptidão. Caso seja aprovado no teste, o aluno receberá o certificado de conclusão e procederá normalmente com a matrícula no Ensino Superior. Para isso, recomenda-se a matrícula em uma instituição de ensino supletivo confiável, isto é, devidamente credenciada junto ao Ministério da Educação (MEC).
b. Candidatos com menos de 18 anos de idade ao tempo da requisição da matrícula no supletivo: neste caso, em virtude da exigência legal [1] de que o aluno tenha a idade mínima de 18 anos para ingressar no curso e concluir o Ensino Médio em um período de tempo menor, as instituições de ensino supletivo negam os pedidos de matrícula aos menores de 18 anos.
Sendo assim, menores de 18 anos que tenham interesse em realizar curso supletivo para entrar na universidade deverão acionar o Poder Judiciário mediante ajuizamento de ação contra o supletivo. Com uma ordem judicial favorável, será possível conseguir a autorização necessária e fazer o curso. Para isso, o primeiro passo é procurar um advogado.
Ao que devo me atentar caso queira ingressar na Justiça para conseguir me matricular no curso supletivo?
Em diversos casos, estudantes recorrem à Justiça para conseguir ingressar no curso superior no qual foram devidamente aprovados. Embora não seja posicionamento unânime, comumente, os juízes têm concedido liminar para que os estudantes consigam a autorização para efetuar a prova de aptidão do supletivo, desde que tenham sido previamente aprovados no vestibular.
Os juízes favoráveis ao ingresso desses alunos na universidade entendem que a aprovação no vestibular revela capacidade e maturidade do aluno para frequentar o Ensino Superior, não havendo razão de se impossibilitar o ingresso somente por conta da idade do estudante.
Além disso, esses juízes também entendem ser irrazoável e desproporcional que o estudante seja impedido de iniciar imediatamente o curso superior, de modo que seria obrigado a prestar novo processo seletivo apenas por não apresentar o Certificado de Conclusão do Ensino Médio.
Portanto, caso o juiz decida favoravelmente logo de início, o aluno deverá comparecer ao supletivo e realizar a prova de aptidão. Se obtiver êxito, o certificado será concedido e o estudante poderá efetuar a matrícula na universidade.
Por outro lado, caso a primeira decisão judicial não seja favorável, o advogado poderá recorrer da decisão, para que um desembargador decida sobre o pedido — havendo, portanto, novas chances de uma decisão favorável ao estudante.
Acerca disso, é importante destacar que, recentemente, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJDFT) uniformizou seu entendimento sobre o tema (IRDR 13). Conforme a tese fixada pelo tribunal, o ensino supletivo não pode ser utilizado, independentemente da idade do aluno matriculado no ensino regular, como forma de avanço escolar e forma de obtenção de Certificado de Conclusão de Ensino Médio para fins de matrícula em instituição de Ensino Superior.
Diante disso, recomenda-se que o estudante procure um advogado tão logo tenha conhecimento de sua aprovação ou, caso já vislumbre a aprovação, mesmo antes do resultado oficial, a fim de ajuizar a ação judicial necessária o mais célere possível.
Documentos necessários para o ajuizamento da ação
Em razão da determinação em lei mencionada anteriormente, o supletivo fornecerá um documento informando a impossibilidade de matricular o aluno que ainda não completou 18 anos. Este documento é conhecido como “negativa” e necessariamente deve ser apresentado em Juízo.
Para consegui-la, basta ir à instituição de ensino supletivo, com o documento de identidade em mãos, informar que é menor de 18 anos e que gostaria de matricular-se. Imediatamente, a instituição fornecerá a negativa, que constituirá a prova de que o estudante está impossibilitado de conseguir o Certificado de Conclusão de Ensino Médio em tempo hábil para efetuar a matrícula na universidade.
A fim de demonstrar a capacidade do estudante para frequentar o Ensino Superior, outras provas também serão importantes, tais como: Histórico Escolar do aluno; comprovação de que foi aprovado no vestibular acompanhada do seu Espelho de Notas e do Boletim de Desempenho e outras evidências que demonstrem que o aluno possui condições de antecipar a conclusão do Ensino Médio (diploma de curso de língua estrangeira, certificados de aluno destaque, etc).
Caso o estudante já consiga vislumbrar a aprovação mesmo antes do resultado oficial, o ideal é que comece a coletar esses insumos documentais o quanto antes a fim de agilizar o processo. Com isso em mãos, o advogado ingressará com uma ação judicial cuja finalidade, conforme explicado anteriormente, é obter uma decisão, logo no início do processo, que determine que a instituição de ensino supletivo deve aplicar a prova.
Posso cursar o Ensino Superior em conjunto com o ensino regular ou supletivo?
Sim. Todavia, é importante ressaltar que tal possibilidade somente é cabível mediante tutela jurisdicional que assegure a realização de curso supletivo ou de ensino regular em conjunto com o Ensino Superior.
Acerca do tema, o Tribunal Federal da Primeira Região (TRF1), por meio do Acórdão de n.º 0045119-72.2012.4.01.3500, ratificou essa possibilidade. Na ocasião, o Juízo concedeu liminar que assegurou que a aluna fosse matriculada no curso, condicionando a procedência do pedido à apresentação de Certificado de Conclusão do Ensino Médio no prazo de um ano.
Apesar de haver essa possibilidade, ressalta-se que a decisão que concede a liminar não é definitiva. Desta forma, a medida pode ser cassada a qualquer momento, sendo apenas o início de um processo que passará por uma análise e julgamento.
Há idade mínima para se matricular em um curso supletivo?
A Lei n.° 9.394/96 prevê que a idade mínima para realizar curso supletivo é de 18 anos. Entretanto, a possibilidade de realizar o curso com idade inferior tem sido amplamente possibilitada pelos tribunais.
Neste diapasão, o Supremo Tribunal Federal (STF) já se manifestou sobre a possibilidade de menores realizarem curso supletivo [2], tendo em vista que a limitação à idade, além de ferir o princípio da razoabilidade, contraria a garantia ao acesso aos níveis mais elevados do ensino, prevista no artigo 208 da Constituição Federal.
Assim, é cabível, mediante tutela jurisdicional, a feitura de prova de curso supletivo a fim de garantir o ingresso de menores de idade no Ensino Superior.
Posso perder minha vaga na universidade caso o tribunal entenda de forma diferente do juiz que concedeu a liminar?
Dificilmente você perderá sua vaga na universidade, conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça (STJ) [3], caso o estudante já esteja cursando a universidade, esta situação fática se cristaliza em razão do decurso de tempo, de maneira que a reversão desse quadro, isto é, a perda da vaga, implicaria em danos irreparáveis ao estudante. É a chamada “teoria do fato consumado”.
Por fim, cabe relembrar que, mesmo diante da incerteza sobre o posicionamento que o juiz adotará, comumente as ações ajuizadas são favoráveis aos estudantes, justamente para viabilizar o ingresso do aluno no curso para o qual foi devidamente aprovado, uma vez que a aprovação no vestibular é capaz de atestar a aptidão técnica compatível ao ingresso na universidade.
Há perigo de demora na concessão de liminar que assegure a inscrição na universidade? Caso haja, há possibilidade de perda do período de inscrição?
Para responder essa indagação, insta ressaltar, inicialmente, que a demora na concessão depende de cada juízo. Nos casos de universidades públicas federais, a competência para julgar essas ações é dos tribunais federais, que, em regra, possuem tramitação mais morosa, tendo em vista a quantidade de estados por eles abarcados.
Por outro lado, nos casos de universidades privadas ou estaduais, a competência é dos tribunais regionais, os quais possuem, em regra, mais agilidade na tramitação de suas demandas.
Ademais, embora haja possibilidade de perda do período de matrícula, o pedido liminar, caso deferido, pode obrigar a universidade a matricular o aluno mesmo assim. O juízo pode, ainda, a pedido da parte, determinar que a universidade seja obrigada a pagar multa pelos dias em que negar o cumprimento da decisão judicial, caso essa negativa venha a acontecer.
[1] Art. 38, § 1°, inciso II da Lei 9.394/1996.
Art. 38. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.
§ 1º Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:
[...]
II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.
[2] STF - RE 764189, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento: 12/08/2013, Publicação: 26/08/2013.
[3] STJ – AgRg no REsp 1291328 RS 2011/0265253-0, Relator: Ministro NAPOLÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 24/04/2012, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe: 09/05/2012.