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Foto do escritorAlberto Malta e Ticiano Figueiredo

Início da prescrição somente após o fim do mandato para ações de improbidade administrativa: são ou

A inconstitucionalidade da postergação do termo inicial de prescrição da pretensão punitiva: a diferenciação anti-isonômica constante do art. 23, inc. I, da Lei de Improbidade Administrativa e suas consequências.

 

Os prazos prescricionais para exercício das pretensões punitivas pela Lei 8.429/92 estão previstos em seu art. 23, sendo conveniente iniciar com a transcrição do comando legal:


Art. 23. As ações destinadas a levar a efeitos as sanções previstas nesta lei podem ser propostas:

I – até cinco anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança;

II – dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.

III – até cinco anos da data da apresentação à administração pública da prestação de contas final pelas entidades referidas no parágrafo único do art. 1º desta Lei.


Como se percebe, há critérios diferenciadores entre os incisos do dispositivo acima, os quais se consubstanciam na adoção de termos iniciais divergentes para a prescrição da pretensão autoral à aplicação das sanções da Lei.


Com relação a detentores de mandato, cargo em comissão ou função de confiança, aplica-se o prazo prescricional de cinco anos após o término do exercício dessas posições.


Ocorre, todavia, que a diferenciação posta na Lei afigura-se inconstitucional, notadamente porque, muitas vezes, busca-se a condenação por atos supostamente ímprobos que se exauriram mais de cinco anos antes do ajuizamento da ação: dessa forma, pode-se alcançar, a partir de fatos idênticos, a absolvição de alguns dos réus pelo reconhecimento da prescrição — agentes públicos não incursos no inc. I do art. 23 — e, concomitantemente, a condenação de outros.


Essa diferenciação é nitidamente anti-isonômica, de modo a ferir diretamente a Constituição Federal. Ora, seria juridicamente válido, a partir de um mesmo quadro fático, afastar a prescrição para um dos réus e, para outros, aplicá-la?


Assim como fere a isonomia, essa forma de diferenciação acaba por ofender a segurança jurídica. Isso porque, praticado um ato supostamente ímprobo, simplesmente se posterga a possibilidade de punição de forma indefinida — não raro, por muitos anos!


Dessa forma, a disposição legal do inc. I do art. 23 da Lei 8.429/92 é diretamente contrária ao art. 5º, caput, da Constituição Federal, que consagra a isonomia entre os cidadãos, bem como ao seu art. 37, § 5º, que dispõe sobre a necessária previsão legal de prazos para prescrição para ilícitos praticados por agentes públicos.


Deveras, na vigência do referido dispositivo, o agente detentor de mandato, cargo em comissão ou função de confiança sofre a grave insegurança de, após o fim do exercício, sujeitar-se por mais cinco anos a pretensões a título de hipotética Improbidade Administrativa.


Para além dessa insegurança jurídica, surge o cerceamento do direito de defesa dos acusados (art. 5º, LV, da CF) e a ofensa ao devido processo legal (art. 5º, LIV, da CF), tendo em vista a necessidade de produzir provas em seu favor em data muito posterior à prática de um ato supostamente ímprobo. Dessa forma, contraria-se toda a sistemática jurídica brasileira relativa ao exercício de pretensões condenatórias perante o Poder Judiciário — enquanto se permite às autoridades policiais e ao Ministério Público que acumulem elementos probatórios por tempo indeterminado, sujeita-se o acusado à necessidade de preservar, também por tempo indeterminado, provas de defesa para algo que nem sequer sabe que lhe será imputado.


Da leitura de alguns excertos doutrinários, observa-se que a justificativa do legislador para essa diferenciação teria sido a hipotética dificuldade de apuração de ilícitos enquanto os agentes temporários encontram-se em exercício. Na obra Ação Civil Pública e Ação de Improbidade Administrativa, por exemplo, assim é explicada a opção legislativa:


Dificilmente procura-se apurar os casos de improbidade durante a gestão dos envolvidos. Mesmo que se dê a iniciativa de investigação no período, há grande possibilidade de interferência na apuração dos fatos. (...) O critério para a escolha é mais político e partidário, posto que prevalecem os interesses de grupos ou de facções, favorecendo o eclodir de atos ímprobos em todos os setores da vida pública.1


Todavia, essa justificativa não nos parece legítima, uma vez que destoa da realidade, sobretudo nos tempos atuais. Ora, o que mais se observa dos noticiários é a deflagração de operações contrárias aos interesses dos detentores de cargos de influência, razão por que o intento de diferenciar o dies a quo prescricional torna-se completamente inócuo.


A diferenciação revela, como dito, a quebra da isonomia e da segurança jurídica e o cerceamento de defesa dos acusados, não havendo justificativa pertinente para sua vigência.


Se assim não era quando da edição da Lei, fato é que, atualmente, não existe a hipotética dificuldade na apuração de atos ímprobos durante a gestão dos envolvidos, sobretudo porque os órgãos persecutórios estão cada vez mais independentes e robustos. Portanto, admitir a disposição legal aqui combatida seria uma espécie de atestado de incompetência (ou subalternidade) das autoridades policiais e do Ministério Público, o que contraria as atribuições que lhes são conferidas pela própria Constituição Federal.


Assim, há que se reconhecer a inconstitucionalidade do inc. I do art. 23 da Lei de Improbidade Administrativa, para que o termo inicial do prazo prescricional para exercício das pretensões punitivas contra detentores de mandato, cargo em comissão e função de confiança seja equiparado ao dos demais agentes públicos.

 

1 RIZZARDO, Arnaldo. Ação civil pública e ação de improbidade administrativa. 3. ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2014. pp. 581 e 582.

 

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