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Foto do escritorHenrique Melo e Cláudio Barbosa

A recuperação extrajudicial como mecanismo de soerguimento da empresa


Além de todas as consequências à saúde pública, a pandemia de Covid-19 tem causado também severos prejuízos ao cenário econômico. No mundo todo, a atividade empresarial sofreu uma forte e repentina desaceleração em virtude das recomendações das autoridades sanitárias de se cumprir um isolamento social no intuito de conter a propagação da doença.


Por esse motivo, é previsto que essa inesperada paralisação da atividade econômica irá causar uma forte recessão responsável por desencadear uma crise financeira. Assim, não há dúvidas de que muitos empresários serão bastante prejudicados por esse cenário que se desenha e sofrerão sérios problemas econômicos.


Ante o exposto, é relevante pontuar que a legislação brasileira oferece ao empresário alguns mecanismos jurídicos capazes de auxiliar o soerguimento financeiro da empresa. São esses, por exemplo, os institutos da recuperação judicial e extrajudicial, ambos previstos na Lei nº 11.101/2015 (Lei de Recuperação de Empresas - LRE).


Assim, visto que essas ferramentas provavelmente serão bastante utilizadas nos próximos meses em razão da crise econômica que está se instalando, o presente artigo se propõe a elucidar – pelo formato de perguntas e respostas - algumas questões a respeito, especificamente, da recuperação extrajudicial. Veja-se:


Quem pode apresentar um pedido de recuperação extrajudicial?


Em primeiro lugar, é importante dizer que a LRE é aplicável apenas ao empresário e à sociedade empresária, exceto àqueles previstos nos incisos I e II do art. 2º da referida lei, quais sejam: empresa pública, sociedade de economia mista, instituição financeira pública ou privada, cooperativa de crédito, consórcio, entidade de previdência complementar, sociedade operadora de plano de assistência à saúde, sociedade seguradora, sociedade de capitalização e outras entidades legalmente equiparadas às anteriores.


Portanto, pessoas físicas e demais pessoas jurídicas não empresárias (Ex: associações, fundações, sociedades civis, etc) não podem se valer da recuperação extrajudicial.


Ademais, a empresa deve, também, cumprir alguns requisitos. Ou seja, no momento do pedido, o devedor deve ter mais de dois anos de exercício regular da atividade empresarial, além de: 1) não ser falido, ou, se o for, ter as responsabilidades da falência extintas por sentença judicial transitada em julgado; 2) não ter obtido concessão de recuperação judicial – nem mesmo a baseada no plano especial para micro e pequenas empresas previsto na Seção V do Capítulo II da LRE - há menos de cinco anos; 3) não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos na LRE.

Em suma, qualquer empresário ou sociedade empresária que observar esses requisitos poderá requerer recuperação extrajudicial.


Quais créditos podem ser abrangidos na recuperação extrajudicial?


Todos os créditos existentes na data de pedido podem ser abrangidos na recuperação extrajudicial, salvo os que se enquadrem nas seguintes exclusões legais: 1) créditos trabalhistas ou oriundos de acidentes de trabalho; 2) créditos fiscais; 3) créditos de titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis; 4) créditos de arrendador mercantil; 5) créditos de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabilidade ou irretratabilidade, inclusive em incorporações imobiliárias; 6) créditos de proprietário em contrato de venda com reserva de domínio; e 7) créditos de adiantamento de contrato de câmbio.


Posto isso, convém ressaltar também que não é necessário que todos os tipos ou classes de credores participem da recuperação extrajudicial. O devedor pode, por exemplo, propor o instituto apenas para os credores com garantia real, ou apenas para os credores quirografários. É permitido, ainda, abranger apenas alguns tipos de credores de uma mesma classe. A título de exemplo, é possível abranger apenas os créditos quirografários de vencimento à curto prazo.

É importante, no entanto, que o devedor se atente para que a escolha dos créditos participantes seja feita por meio de critérios objetivos e impessoais, a fim de se evitar a configuração de fraudes.


Como ocorre a aprovação do plano de recuperação extrajudicial e quais são os seus efeitos?


Após a definição dos créditos participantes, o devedor deverá apresentar aos credores um plano de recuperação extrajudicial no qual constem as propostas para a recuperação da empresa e as novas condições de pagamento das dívidas, para que, em seguida, os credores possam deliberar acerca da aprovação ou rejeição do referido plano.

Caso o plano seja aprovado por unanimidade, o acordo celebrado será válido e terá a mesma força e efeitos de qualquer outro contrato privado. As dívidas serão efetivamente novadas nos termos ajustados, de modo que a homologação judicial do plano será facultativa. Embora não seja necessário, o devedor pode querer homologar o plano para que o documento adquira força de título executivo judicial ou para realizar a venda de estabelecimento por meio de hasta judicial. Por outro lado, não havendo unanimidade, a aprovação do plano de recuperação judicial requer a deliberação de mais de 3/5 (três quintos) do valor total dos créditos participantes. Contudo, nesse caso, o acordo só terá validade se for submetido à homologação judicial. Após a homologação, então, todas as dívidas previstas no plano serão novadas nos termos acordados, sendo válidas, inclusive, para os credores que forem vencidos na deliberação.


Quais são outras informações importantes a respeito da recuperação extrajudicial?


É importante pontuar ainda que a LRE proíbe que o plano de recuperação extrajudicial determine o pagamento antecipado de dívidas ou que confira tratamento desfavorável aos credores não sujeitos a ele. O objetivo desse dispositivo é evitar fraudes em que o devedor privilegie indevidamente alguns credores em detrimento de outros.


Além disso, é relevante ressaltar também que o plano de recuperação extrajudicial pode, eventualmente, prever a exclusão ou substituição de garantias. Todavia, isso só será admitido se houver aprovação expressa do credor titular da garantia em questão.


Por fim, convém chamar a atenção para o fato de que a recuperação extrajudicial é uma faculdade do devedor, o que não impede que ele realize outros tipos de negociações com credores.


Entretanto, apesar do devedor poder se valer de outras formas de negociação, não há dúvidas de que a recuperação extrajudicial pode ser um mecanismo muito importante para o empresário ou para a sociedade empresária contornar a crise econômica que virá em decorrência da pandemia do Covid-19.


Isso porque esse instituto permite a renegociação de novas condições de pagamento de créditos de uma mesma classe ou tipo sem a necessidade de uma aprovação unânime. Afinal, como se viu, a deliberação de 3/5 (três quintos) dos créditos já é suficiente para aprovar o plano de recuperação extrajudicial, de modo que essa alternativa deve ser sempre levada em consideração pelos empresários ou sociedades empresárias em momentos de dificuldades econômico-financeiras.

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